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A força que no fim não se extinguuiu

O zeitgeist era bastante distinto em 2013, quando Moisés Naím lançou seu livro, O Fim do Poder. Naquele tempo, a
A força que no fim não se extinguuiu

O zeitgeist era bastante distinto em 2013, quando Moisés Naím lançou seu livro, O Fim do Poder. Naquele tempo, a economia global ainda lidava com as consequências da crise financeira de 2008, enquanto cresciam os protestos em resposta às desigualdades sociais em ascensão. As redes sociais estavam dando visibilidade a um número maior de vozes (como demonstrado na Primavera Árabe), e novos desafios às estruturas de poder tradicionais, tanto políticas quanto corporativas, começaram a se desenhar. Naquele momento, mais da metade da população mundial vivia sob regimes democráticos, e a revolução digital e tecnológica apenas começava a acelerar, um fenômeno que se intensificou na última década com a popularização do smartphone, a presença massiva das redes sociais e a introdução da inteligência artificial em nossas vidas.

Foi nesse panorama que Naím apresentou sua ideia: o poder tradicional estava em um processo de declínio, tornando-se mais disperso e vulnerável, o que tornava mais fácil sua conquista, mas mais difícil sua utilização e mais simples sua perda.

Esse fenômeno se dava, por um lado, pela ampliação das interações sociais e pelo aumento em número de pessoas, países, partidos políticos, conflitos, empresas, produtos e consumos. Por outro lado, a mobilidade crescente de pessoas, bens e capitais, decorrente da globalização, complicava o controle sobre tais aspectos. E, por fim, Naím apontava que esse declínio estava ligado a uma transformação global nas mentalidades, expectativas e exigências das pessoas em relação às esferas de poder.

Naím tinha uma visão esperançosa para o futuro, acreditando que as sociedades estavam se tornando mais livres e que diferentes grupos sociais ou políticos poderiam alcançar um público mais amplo com suas mensagens, resultando em escolhas mais bem informadas e em uma qualidade de vida aprimorada. Contudo, ele também alertou sobre o risco de paralisia política devido à fragmentação social e os perigos associados, como o aumento da desordem social, a diminuição da influência dos partidos políticos tradicionais, a desvalorização do ativismo online baseado em “likes” e “seguidores”, a dificuldade de concentrar a atenção pública no que realmente importa e, por fim, a alienação das pessoas em relação aos processos políticos, exacerbada pelo incessante fluxo de notícias sobre escândalos e corrupção. A solução para esses problemas passaria por um fortalecimento dos partidos políticos estabelecidos, fundamentado na confiança, aumento da participação cívica e no enfrentamento da desinformação e demagogia no debate político.

Estamos em 2025 e as ideias de Naím parecem ao mesmo tempo proféticas e ingênuas. Em vez de avançarmos em direção a sociedades mais livres e abertas, a última década foi marcada por uma polarização e radicalização do discurso político, alimentadas pela irracionalidade, pelo ódio e pelo tribalismo, cada vez mais caracterizados pela lógica do “nós contra eles”. Diante do aumento dos desafios e problemas que afligem a sociedade, existe uma percepção generalizada de que as instituições democráticas já não estão operando de forma eficaz, mas ainda não surgiram alternativas políticas inovadoras e suficientemente resilientes que ofereçam um caminho adiante na organização societal global.

Pelo contrário, a ascensão de tendências autoritárias em muitos países considerados bastiões da democracia liberal, com os EUA sendo um exemplo notável, revela esta incapacidade coletiva de enfrentar os problemas atuais, buscando soluções em fórmulas do passado que pensávamos superadas, especialmente no contexto ocidental. É alarmante perceber que, segundo o Instituto V-Dem, em 2024 apenas 28% da população global residia em democracias, em comparação com 51% em 2004. O próprio Moisés Naím sentiu-se compelido a revisitar suas hipóteses, lançando em 2022 o livro The Revenge of Power: How Autocrats Are Reinventing Politics for the 21st Century (ainda não traduzido para o português).

Sou uma dessas pessoas que acredita que a trajetória da humanidade é feita de avanços e retrocessos. Assim como o renomado historiador contemporâneo Timothy Snyder propõe, não devemos nos apegar a políticas da inevitabilidade, acreditando que o progresso é uma linha contínua que toma rumo sempre para o melhor; mas também não devemos nos deixar aprisionar por políticas da eternidade, voltando ao passado diante da incapacidade de lidar com o presente e de imaginar um futuro. A História se desenrola em algum ponto entre esses dois extremos, e cabe a cada um de nós contribuir para escrevê-la, participando ativamente da vida em sociedade de maneira informada, racional e, acima de tudo, humana.

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