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«Sem a presença de migrantes, muitos serviços deixariam de existir» – padre Lino Maia

Com a proximidade do Dia Mundial dos Pobres e o encerramento da primeira semana de debates sobre o Orçamento do
«Sem a presença de migrantes, muitos serviços deixariam de existir» – padre Lino Maia

Com a proximidade do Dia Mundial dos Pobres e o encerramento da primeira semana de debates sobre o Orçamento do Estado, o presidente da Confederação Nacional das Instituições Particulares de Solidariedade Social (CNIS) é o convidado da Renascença e da Agência Ecclesia.

Entrevista realizada por Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

Em seu editorial no jornal Solidariedade, ele expressa preocupações sobre a possibilidade de o Governo não cumprir o Pacto de Cooperação para a Solidariedade. Que sinais ele apresenta para essa preocupação?

As negociações para atualizações dos acordos de cooperação já tiveram início. A perspectiva, no momento, é realmente negativa. Sabemos que há valências cujas contribuições públicas são extremamente baixas, como os Centros de Dia e ATL, onde não atingimos os 50%, estando bem abaixo, cerca de 35%. Portanto, estamos muito aquém do necessário.

Para alcançarmos os 50% previstos no Pacto de Cooperação, as expectativas não são encorajadoras. Certamente, iremos pressionar e insistir, tanto em momentos apropriados quanto em outros em que não o são, pois uma promessa é um compromisso, e, dado que isso está registrado em um pacto, devemos buscar a aproximação aos 50% em muitas áreas de serviço.

Então, há risco de um acordo atualmente, há um prazo limite?

Isso precisa ser negociado o quanto antes. O acordo pode ou não ser concretizado; pode não haver acordo, de fato. Tudo leva a crer que, antes do final do ano, chegaremos a uma conclusão, para que em janeiro de 2026, já possamos estar atualizando as contribuições públicas.

Você sente que o Estado está priorizando benefícios sociais em detrimento do apoio às iniciativas sociais?

Parece claro, de fato. Como já mencionei em meu editorial, o Orçamento do Estado parece ignorar esses setores. Algumas pessoas podem pensar que há ajustes nas prestações sociais. Sim, há atualizações, mas precisamos analisar e concretizar isso. O setor social e as IPSS oferecem imensa ação social em favor dos mais necessitados. No que se refere às atualizações dos acordos de cooperação, o Orçamento do Estado não se pronuncia.

Neste contexto, a boa cooperação entre o Estado e o setor social pode estar ameaçada?

Se não tomarmos medidas em direção à meta dos 50%, isso estará em risco. Além disso, surgem outras questões que são fundamentais. Existe um discurso crescente sobre a transformação dessas instituições em empresas sociais. Isso é preocupante, pois ao se tornarem empresas, poderemos estar excluindo aqueles que realmente necessitam de apoio. Os serviços ficarão acessíveis apenas àqueles que podem pagar, deixando muitos para trás e ampliando a pobreza, além de excluir muitas pessoas que precisam de serviços que apenas essas instituições podem fornecer, focando nos mais vulneráveis.

Assim, existe uma tendência de priorizar o lucro com a criação de uma empresa social em detrimento da luta contra a pobreza?

Embora o lucro não seja o foco imediato, isso se tornará uma prioridade a partir do momento em que priorizarmos os que podem pagar.

Você vê uma distorção na natureza dessas instituições com essa proposta?

Sim, na proposta. Isso pode significar o fim ou um sério comprometimento dessas instituições, que podem se limitar a serem meras instituições de caridade. A caridade é crucial, mas ela é realizada apenas por quem tem recursos, e assim muitos necessitados poderão ser excluídos dos serviços de que precisam.

O Orçamento do Estado prevê um aumento de 50 euros no próximo ano, alcançando 920 euros. Embora você defenda a ideia de salários dignos, também expressa preocupações sobre a fragilidade financeira dessas instituições. Esse aumento é aceitável? Isso pode ser insustentável para as instituições? a) Existe risco de novas falências? Como balancear a justiça do aumento com a saúde financeira das IPSS?

Primeiro, sou totalmente favorável ao aumento do salário mínimo, visto que é realmente baixo. Nas instituições, é nítido que o salário recebido é insuficiente, pois com um trabalho menos árduo e até melhor remunerado, os funcionários estão migrando para outros setores, deixando as instituições. Já estamos sentindo dificuldade em recrutar trabalhadores nas instituições de solidariedade. Um aumento no salário mínimo impacta bastante as instituições porque, enquanto na economia geral a massa salarial representa cerca de 17% a 18% dos custos, nas instituições de solidariedade, essa porcentagem é de 70%. Portanto, qualquer aumento terá um impacto significativo.

Notamos que a necessidade de atenção a isso não está sendo considerada, e precisamos lutar para que haja um aumento significativo nas contribuições públicas para que as instituições possam remunerar melhor seus profissionais e não perder talentos.

Então, há realmente risco de novas falências no setor, e como compatibilizar o aumento salarial com a saúde financeira das instituições?

Claramente, temos apenas duas opções. Ou as instituições se afastam de sua essência e começam a aceitar apenas os clientes que podem pagar, ou o Estado eleva suas participações. Por exemplo, numa ERPI (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas), o custo médio previsto para 2025 é de 1.630 euros por usuário, e o de 2026 será ainda maior; se o Estado apenas compartilha 700 euros, significa que cada usuário e seus familiares terão que cobrir cerca de 900 euros. Quais usuários poderão realmente arcar com esses 900 euros, considerando que muitas pensões são baixas e variam significativamente de região para região? Portanto, é necessário um aumento substancial nas contribuições públicas do Estado, reafirmo, para que as instituições mantenham sua missão de atender aos mais desfavorecidos.

Ou que possam falir devido ao aumento do salário mínimo?

Não gosto de empregar esse termo e de sugerir esse risco, mas ele é real. Os dirigentes estão fazendo esforços constantes, buscando o envolvimento da comunidade, criando soluções, mas muitas instituições estão se endividando progressivamente. Nossos estudos mostram que 50% ou mais das instituições culminam o ano com resultados negativos.

E essas instituições são sempre as mesmas, indicando que a possibilidade de falência pode de fato ser uma realidade assustadora. Mas o endividamento não pode ser um ciclo sem fim; isso precisa ter limites.

Você comentou sobre as dificuldades no recrutamento de trabalhadores nas instituições particulares de solidariedade social, sabendo que muitos desses profissionais são imigrantes. A nova lei sobre imigração e nacionalidade tornará ainda mais complicado esse recrutamento?

Sem dúvida. Eu sou um tanto cético quanto ao discurso atual, que predomina. Nós, portugueses, temos uma longa história de imigração e não podemos adotar uma postura de fechamento em relação aos imigrantes. Precisamos de mais mão de obra estrangeira, especialmente porque a população de origem portuguesa está envelhecendo. Se não fossem os imigrantes, muitos serviços deixariam de existir.

Nas instituições de solidariedade, temos muitos imigrantes que são uma grande contribuição. O problema é que frequentemente eles permanecem nas instituições apenas alguns meses para formação e, em seguida, buscam oportunidades onde a remuneração é melhor ou onde o trabalho é menos exigente. A dificuldade de recrutamento persiste, mas insisto, eles são um grande trunfo, e muitos possuem qualificações que os levam a aceitar empregos que exigem menos formação.

Além disso, notamos que em muitos desses imigrantes surge a formação de laços afetivos com os usuários, proporcionando um tratamento humano e acolhedor, algo que é fundamental nas nossas instituições.

Vamos abordar um novo projeto, pois temos tratado principalmente de desafios, mas as instituições continuam firmes em seu trabalho. Em outubro, iniciou-se o projeto que integra saúde ao apoio domiciliar, denominado SAD+Saúde. Como tem sido a evolução deste projeto?

Estamos lutando por isso há vários anos. O projeto piloto está sendo implementado em cinco regiões do país, com instituições se candidatando e aguardando aprovação. Iniciar essa jornada é crucial. Embora já ofereçamos cuidados de saúde no apoio domiciliar, isso não é oficialmente previsto nem suportado. Os usuários do SAD, frequentemente necessitam de cuidados de saúde ininterruptos, além do apoio que recebem durante o dia.

Isso é extremamente importante, especialmente em áreas de baixa densidade populacional, onde ter alguém que chegue à meia-noite para administrar medicamentos ou auxiliar os usuários é fundamental. Acredito que essa medida do SAD+Saúde é realmente significativa e, se receber apoio adequado do Estado, poderá logo se expandir por todo o território nacional.

Não afirmo que todas as instituições irão aderir, pois ainda haverá a necessidade de outros tipos de apoio domiciliar, mas o SAD+Saúde deverá se tornar a verdadeira direção a seguir.

Atualmente, discute-se na Concertação Social uma nova reforma da legislação trabalhista. Essa é uma questão constante? Os sindicatos já manifestaram sua oposição a esta proposta de reforma?

É provável que ocorram atualizações, mas tenho minhas preocupações. Os trabalhadores não são um obstáculo, eles são a solução. Não podemos ter uma legislação que apenas beneficie empregadores; é essencial que a legislação respeite e proteja os direitos e a dignidade dos trabalhadores. Tenho receio de que qualquer mudança significativa na legislação trabalhista possa comprometer esses direitos e ferir a dignidade dos trabalhadores. O início dessa discussão foi muito problemático, e espero que, quando for encaminhada ao Parlamento, nos mantenhamos firmes nos direitos de todos. Reitero, os trabalhadores não são o problema, são parte da solução. Quando houver descumprimento, naturalmente, existem leis, mas não devemos enxergá-los como uma dificuldade.

Estamos nos aproximando do fim desta entrevista e gostaria de retomar o que foi mencionado anteriormente. É comum dizer que o setor social preenche onde o Estado não chega. Para que isso continue a acontecer, é indispensável fortalecer a cooperação?

Ciertamente. Temos enfrentado dificuldades, principalmente porque o Estado costuma priorizar áreas com alta densidade populacional devido à questões eleitorais. As zonas de baixa densidade frequentemente ficam à mercê da sorte. Em Portugal, não observamos uma política de coesão territorial e social que seja verdadeiramente necessária.

Receio que essas áreas fiquem ainda mais excluídas, e é vital que as instituições permaneçam presentes. No estudo que estará disponível em breve, ficará claro que em muitas aldeias de Portugal, o único serviço existente é fornecido por essas instituições. Em 23% a 27% das aldeias, o único apoio disponível é proveniente delas. Se não fossem essas instituições, muitos não teriam qualquer tipo de assistência.

O Papa Francisco, em sua primeira exortação apostólica, “Dilexi Te”, publicada em 9 de outubro, retomou críticas à “economia que mata”. Qual é a relevância desta exortação no contexto social atual em Portugal?

Primeiramente, é necessário estudar e refletir sobre seus alertas. Estou preocupado com o caminho que Portugal está seguindo em direção a um liberalismo excessivo. Sou a favor da liberdade, mas deve-se ter em mente que o lucro não deve ser o objetivo principal; nosso foco deve ser servir as pessoas. Temo que estejamos perdendo o rumo. Defendo vigorosamente dois princípios fundamentais da doutrina social da Igreja: a proteção à vida, desde a concepção até à morte natural, e a dignidade da pessoa.

Acredito que estamos vivenciando consequências dessa “economia que mata”, que desconsidera e menospreza a dignidade de todo ser humano, o que é uma preocupação crescente.

E essa é uma mensagem central para as instituições e para o setor social na luta contra a pobreza?

Sem dúvida. Posso afirmar que as instituições são uma luz e um alerta constante contra essa economia que causa tanto sofrimento.

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