Já se escreveu e falou bastante sobre Henrique V, e é difícil acreditar que ainda exista muito a acrescentar. No entanto, Dan Jones, que passou as últimas duas décadas a escrever sobre os Plantagenetas, a dinastia que governou praticamente toda a Inglaterra medieval, acredita que este personagem fascinante e enigmático merece uma nova biografia que examine minuciosamente “sua vida antes de se tornar rei”, em vez de focar apenas nos altos e baixos da sua trajetória militar e política — pois Henrique V ascendeu ao trono “apenas no meio da narrativa”. “É por essa razão que, ao longo da última década, planejei escrever uma biografia que apresentasse um retrato independente do rei e do homem, ao mesmo tempo que funcionasse como um volume conclusivo para ser lido em conjunto com The Plantagenets e The Hollow Crown [sem edição em Portugal]: não exatamente a terceira parte de uma trilogia, mas sim o painel final de um tríptico”, expõe o historiador.
Henrique V nasceu, provavelmente, em 16 de setembro de 1386, no castelo de Monmouth, na Inglaterra. Sua mãe, Maria de Bohun, e seu pai, Henrique Bolingbrook, eram membros da nobreza, sendo o pai filho do duque de Lencastre, João de Gante, um dos homens mais poderosos e influentes do reino e pai da rainha portuguesa, D. Filipa de Lencastre. Henrique V não foi preparado para o trono desde cedo e passou sua infância e juventude no círculo próximo de um rei — seu primo, Ricardo II de Inglaterra. O primeiro evento oficial em que ele participou foi o casamento de Ricardo em 1396, na cidade de Calais, com Isabel de Valois, a filha mais velha do rei da França, que apenas tinha seis anos (enquanto o rei inglês contava com 29). Esta união foi estabelecida como parte de um tratado de paz com o reino vizinho, com o qual a Inglaterra estava em conflito desde 1337 — uma guerra que Ricardo II não desejava e queria que chegasse ao fim o mais rápido possível.
No ano de 1396, Ricardo II já estava no trono da Inglaterra há quase duas décadas. Ele tinha apenas dez anos quando foi coroado após a morte do avô, o idoso Eduardo III, em 1377. Seu pai, também chamado Eduardo e conhecido como o Príncipe Negro, faleceu em 1376, vítima de uma enfermidade contraída durante uma campanha militar na região de Castela, na Espanha, da qual nunca se recuperou. Naquela época, a Inglaterra era um reino exaurido de seus recursos, que haviam sido gastos na guerra em França, sem resultados visíveis. O povo estava cansado, e Ricardo, com uma personalidade muito distinta da de seu pai e avô, estava determinado a encerrar esse ciclo. Ele desejava se dedicar tranquilamente ao que lhe dava mais prazer — ao luxo e à cultura da corte, cercado por um grupo restrito de amigos que apoiavam suas decisões, por mais extravagantes que fossem.
▲ Capa de “Henrique V”, de Dan Jones, editada em português pela Vogais
No entanto, a situação na Inglaterra não era tranquila. Em 1388, a grande dependência de Ricardo em relação a seu círculo de amigos e seus gastos excessivos resultaram na reação de um grupo de nobres, incluindo seu primo Henrique Bolingbroke e seu tio Tomás de Woodstock, que passaram a dominar o reino. Em 1391, Ricardo II conseguiu retomar o controle, mas nunca esqueceu do que havia sofrido. Então, em 1398, inesperadamente, ele retaliou esses que lhe haviam retirado o poder, exilando a maioria deles, inclusive Henrique, e mandando executar Tomás de Woodstock, que estava preso em Calais. Após a morte de João de Gante, Ricardo deserdou seu primo, removendo-lhe todas as riquezas e títulos. Em 1399, Henrique decidiu voltar e agir — retornando do exílio e tomando o trono, mudando assim seu destino e o de seu filho para sempre.
Henrique IV foi coroado no dia 12 de outubro de 1399, um domingo chuvoso, na Abadia de Westminster. A chuva caía torrencialmente. Seu filho Henrique, então com apenas 13 anos, acompanhou seu pai de perto, carregando pelo corredor central da igreja a Cortana, a espada cerimonial usada nas coroações inglesas. Ele ainda era uma criança, mas já tinha compreensão sobre as implicações daquela mudança para a vida do pai e para a sua própria. No ano seguinte, Ricardo II, forçado a abdicar em prol do primo, foi assassinado no Castelo de Pontefract, onde estava em custódia, encerrando assim a conspiração que pretendia restaurá-lo ao trono.
Henrique IV herdou a tarefa de suceder um rei que causou enormes tumultos internos e cuja governança foi marcada por controvérsias. Contudo, seu reinado não foi menos complicado que o de Ricardo II. Desde o início, sua reivindicação ao trono foi contestada, e Henrique teve que lutar incessantemente contra as vozes dissidentes que insistiam em sua substituição, seja por um falso Ricardo ou por um primo distante de linhagem nobre, dependendo de seus próprios interesses. Nem mesmo as regiões fronteiriças, há muito sob domínio inglês, lhe concederam paz — em 1400, após mais de um século de controle inglês, Gales se revoltou. O líder da insurreição era Owain Glyndwr, “um homem de boa linhagem, bem educado e experiente em combate”, em seus 40 anos, que almejava reivindicar o título de Príncipe de Gales. Assim, em outubro desse mesmo ano, o rei enviou seu filho, que detinha o título, para Chester, na fronteira com Gales, para lutar pelo que lhe pertencia.
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