
Durante quase 300.000 anos, os primeiros humanos moldaram ferramentas de pedra com grande exatidão, mesmo enfrentando incêndios florestais constantes, secas severas e mudanças drásticas em seu ambiente. Um novo estudo publicado na Nature Communications revela evidências surpreendentes dessa longa tradição tecnológica na Bacia do Turkana, no Quênia.
No Sítio Namorotukunan, uma equipe internacional de pesquisadores descobriu um dos registros mais antigos e duradouros da fabricação de ferramentas de pedra do período Oldowan, datando de cerca de 2,75 a 2,44 milhões de anos atrás. Esses implementos ancestrais — essencialmente os primeiros “canivetes suíços” multifuncionais feitos por hominídeos — demonstram que nossos antepassados não apenas se adaptaram a mudanças extremas, mas floresceram durante uma das eras mais instáveis da Terra.
“Este local revela uma história extraordinária de continuidade cultural”, afirmou David R. Braun, autor principal e professor de antropologia na Universidade George Washington, que também tem ligação com o Instituto Max Planck. “O que estamos vendo não é uma inovação pontual — é uma tradição tecnológica consolidada ao longo do tempo.”
De acordo com Susana Carvalho, diretora de ciência do Parque Nacional Gorongosa em Moçambique e autora sênior do estudo, “Nossas descobertas sugerem que o uso de ferramentas pode ter sido uma adaptação mais generalizada entre nossos ancestrais primatas.”
“Namorotukunan oferece uma rara perspectiva sobre um mundo em transformação, longínquo — rios em movimento, incêndios devastadores, aridez se intensificando — e as ferramentas, imutáveis. Por cerca de 300.000 anos, a mesma técnica persiste — talvez revelando as raízes de um dos nossos hábitos mais antigos: usar tecnologia para nos estabilizar diante da mudança”, disse Dan V. Palcu Rolier, autor correspondente e cientista sênior na GeoEcoMar, Universidade de Utrecht e Universidade de São Paulo.
Principais Descobertas
Domínio da Tecnologia ao Longo dos Milênios: Os primeiros hominídeos elaboraram ferramentas de pedra com lâminas afiadas com notável precisão e consistência. Suas concepções duradouras mostram que conhecimento e técnica foram transmitidos por inúmeras gerações, formando um legado de habilidade e inovação.
Ciência Moderna e Pedra Antiga: Utilizando datagens por imã de cinzas vulcânicas, padrões magnéticos preservados em sedimentos antigos, análises químicas de rochas e traços microscópicos de plantas, os pesquisadores reconstruíram uma linha do tempo ambiental que conecta a fabricação de ferramentas primitivas a grandes transformações climáticas.
Adaptação em Meio ao Turbulento Ambiente: Esses primeiros fabricantes de ferramentas viveram períodos de intensa instabilidade climática. Sua capacidade de criar ferramentas versáteis expandiu novas possibilidades alimentares, incluindo o acesso à carne, transformando o estresse ambiental em uma vantagem evolutiva.
Opiniões dos Especialistas
No local, a técnica é notavelmente consistente: “Essas descobertas mostram que, por volta de 2,75 milhões de anos atrás, os hominídeos já eram proficientes na fabricação de ferramentas de pedra afiadas, sugerindo que o início da tecnologia Oldowan é mais antigo do que pensamos”, afirmou Niguss Baraki da Universidade George Washington.
A evidência de abate é clara: “Em Namorotukunan, marcas de corte ligam ferramentas de pedra à ingestão de carne, revelando uma dieta ampliada que perdurou em paisagens em mudança”, disse Frances Forrest da Universidade de Fairfield.
“O registro fóssil de plantas conta uma história incrível: a paisagem passou de pântanos exuberantes para gramados secos consumidos pelo fogo e semidesertos”, afirmou Rahab N. Kinyanjui do Museu Nacional do Quênia / Instituto Max Planck. “À medida que a vegetação se transformava, a fabricação de ferramentas permanecia constante. Isso é resiliência.”
O artigo, “A tecnologia Oldowan precoce prosperou durante as mudanças ambientais do Plioceno na Bacia do Turkana, Quênia,” foi publicado hoje (4 de novembro) na Nature Communications.
Esta pesquisa foi conduzida por uma equipe internacional de arqueólogos, geólogos e paleoantropólogos de instituições no Quênia, Etiópia, Estados Unidos, Brasil, Alemanha, Índia, Países Baixos, Portugal, Romênia, Espanha, África do Sul e Reino Unido. O trabalho de campo foi realizado sob a orientação do Museu Nacional do Quênia e com o apoio das comunidades Daasanach e Ileret.
Este estudo foi realizado com permissão do Museu Nacional do Quênia e do Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia do Quênia, e em parceria com a Escola de Campo Koobi Fora. O financiamento foi fornecido pela Fundação Nacional de Ciência dos EUA, pela Fundação Leakey, pelo Palaeontological Scientific Trust, pelo Conselho de Pesquisa da Holanda, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, pelo Museu Americano de História Natural e pela Autoridade Nacional de Pesquisa Científica da Romênia.
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