
Existem fotografias que encerram uma verdade tão elementar que quase passam despercebidas — talvez porque a agitação do mundo contemporâneo nos tenha ensinado a ignorar o óbvio. Uma delas é esta: a existência se assemelha a um eco; sempre nos devolve o que emitimos. O que oferecemos é o que recebemos. Simples? Possivelmente. Mas algumas verdades só revelam sua profundidade quando a maturidade nos força a refletir sobre o passado.
Recordemos a narrativa do garoto que clama para a montanha. Inicialmente, expressa sua raiva, em seguida, sua impaciência, e por fim, lança um insulto. A montanha simplesmente retorna exatamente o que ouviu. Somente quando tenta uma palavra gentil é que o vale se ilumina com uma nova melodia. Sem nada de mágico ou misterioso: o eco se limita a repetir. A vida opera da mesma forma. No entanto, seguimos agindo como se isso não fosse verdade.
Atualmente, as palavras se tornaram leves, rápidas, quase descartáveis — e, paradoxalmente, mais impactantes do que nunca. Basta soltarmos uma irritação em uma tela para que se transforme em um clima. Um comentário impulsivo ganha vida própria. Uma resposta apressada contamina um dia inteiro. E depois nos surpreendemos com a dureza que retorna, como se não fosse a continuação do que antes deixamos escapar.
Porém, o oposto também é verdadeiro. Uma atenção silenciosa, um gesto que não precisa ser notado, uma palavra acolhedora — e algo começa a se transformar. O eco do bem é mais sutil, menos estrondoso, mas possui uma persistência que não se desvanece. O bem nunca produz um barulho imediato; ele vai abrindo caminhos.
Alguns chamam isso de reciprocidade. Outros se referem a karma. Há quem fale em justiça poética. Eu prefiro denominá-lo Providência — essa estrutura invisível que não elimina a liberdade humana, mas a orienta; essa presença discreta que nos faz lembrar que a maneira como tratamos o mundo geralmente determina como o mundo nos trata, com aquele toque silencioso de Deus que passa, mas deixa marcas.
É essa presença que, sem imposição, vai equilibrando a balança, nos convidando a ouvir o que deixamos escapar no dia a dia: a forma como nos comunicamos, a maneira como cuidamos, a celeridade com que julgamos, a paciência que dedicamos à espera. Nada disso se perde. Tudo retorna. Tudo ecoa.
Hoje, muito se discute sobre transformação social, comunicação não violenta, saúde mental e convivência saudável. Talvez, antes de tudo isso, precisemos retomar essa antiga consciência: a vida nos responde pela mesma música que oferecemos a ela.
Se aspiramos a uma sociedade menos hostil, alguém deve iniciar o desarmamento do tom. Se desejamos espaços mais humanos, alguém precisa começar a humanizar os gestos. Se sonhamos com uma comunidade mais iluminada, alguém deve acender uma luz — mesmo que pequena.
Nada se altera sem um primeiro passo, e quase sempre esse passo exige desconforto.
A questão fundamental não é o que o mundo nos faz, mas o que fazemos ao mundo. O eco possui essa particularidade: só nasce quando há voz. Por isso, talvez o maior risco de nossa época seja não falar demais, mas falar de menos sobre o que realmente merece ser repetido.
Ao final de tudo, resta-nos uma certeza simples e exigente: não controlamos o eco, mas temos o domínio sobre a voz. A vida não nos devolve perfeição, mas nos traz sentido. E é a Providência que, dia após dia, nos murmura que não existem gestos perdidos, palavras inúteis ou silêncios estéreis. Tudo o que plantamos — mesmo o que consideramos insignificante — encontra seu caminho de volta. E é nesse retorno, nesse reflexo inesperado, que a verdade do nosso coração se revela. É ali que compreendemos quem somos. E quem ainda podemos nos tornar.
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