
A borboleta azul Atlas, cujo nome científico é Polyommatus atlantica, foi geneticamente identificada como a espécie com o maior número de cromossomos entre todos os animais multicelulares do planeta.
Esse inseto possui 229 pares de cromossomos, enquanto muitos de seus parentes próximos têm apenas 23 ou 24 pares. Pesquisadores do Wellcome Sanger Institute e do Instituto de Biologia Evolutiva (IBE: CSIC-UPF), em Barcelona, revelaram que esses cromossomos foram fragmentados ao longo do tempo, ao invés de serem duplicados.
O primeiro estudo genômico dessa borboleta, publicado em 10 de setembro na revista Current Biology, permite que os especialistas comecem a investigar as razões evolutivas por trás desse número extremo de cromossomos. Mudanças nos cromossomos também são observadas em células cancerosas humanas, e portanto, compreender esse processo em diferentes espécies pode auxiliar na pesquisa sobre câncer.
Esta é a primeira vez que o genoma da borboleta azul Atlas foi sequenciado. A partir disso, os especialistas criaram um genoma de referência de alta qualidade para essa espécie, permitindo que os pesquisadores comparem esse genoma extremo com o de outras borboletas e mariposas a fim de entender melhor como as espécies se formam e se transformam ao longo do tempo.
A evolução e o desenvolvimento de novas espécies ocorrem ao longo de milhões de anos, o que torna difícil o seu estudo prático. Em vez disso, os especialistas podem usar o DNA de uma espécie e compará-lo com outros do mesmo grupo para compreender quais genes e características foram mantidos e quais foram perdidos, e assim formular hipóteses sobre os motivos por trás dessas mudanças.
Conhecer a história genética de uma espécie também nos permite antever possíveis direções futuras. Por exemplo, poderemos entender como uma espécie poderia reagir ao aumento da temperatura global e se possui genes ou mecanismos que podem protegê-la. Isso pode informar esforços de conservação, bem como pesquisas para desenvolver culturas mais resilientes.
A borboleta azul Atlas é encontrada nas serras do Marrocos e no nordeste da Argélia. Embora já se suspeitasse que tivesse o maior número de pares de cromossomos do reino animal, esta é a primeira vez que os especialistas sequenciam o genoma da borboleta para confirmar essa informação1. Para comparação, um parente próximo bastante comum no Reino Unido, a borboleta azul comum, possui 24 cromossomos.
Mudanças nos números de cromossomos são vistas como fatores que contribuem para a formação de novas espécies e ajudam os organismos a se adaptarem ao seu ambiente. O grupo ao qual a borboleta azul Atlas pertence contém várias espécies intimamente relacionadas que evoluíram em um curto período de tempo.
No novo estudo, a equipe descobriu que os cromossomos foram fragmentados em pontos onde o DNA é menos compactado. Dessa forma, a quantidade total de informação genética permaneceu a mesma, mas foi distribuída em seções menores. Todos os cromossomos, exceto os cromossomos sexuais, foram cortados, e os pesquisadores estimam que isso fez o número de cromossomos saltar de 24 para 229 em cerca de três milhões de anos — um intervalo relativamente curto em termos evolutivos.
Normalmente, considera-se que esse tipo de alteração cromossômica extrema é negativo; no entanto, a borboleta azul Atlas evoluiu e sobreviveu por milhões de anos. Somente agora, devido às mudanças climáticas e ao impacto humano sobre o meio ambiente, como a destruição de florestas de cedro e a superpastejo, suas populações enfrentam ameaças.
Esta pesquisa levanta diversas questões que poderão ser exploradas no futuro. A fragmentação dos cromossomos poderia promover uma maior diversidade genética ao permitir uma recombinação mais frequente das partes do genoma ou trazer outros benefícios desconhecidos. Embora isso possa ajudar as borboletas a se adaptarem rapidamente, espécies com muitos cromossomos também podem enfrentar desafios devido à complexidade adicional, o que poderia torná-las mais vulneráveis à extinção ao longo do tempo. Investigações adicionais e comparações com outras borboletas poderiam revelar se algum gene foi perdido ou preservado, oferecendo mais informações sobre a biologia desses insetos, além de um entendimento mais profundo sobre a evolução.
A reorganização cromossômica também ocorre em cânceres humanos, e portanto, estudar esses processos no DNA da borboleta azul Atlas poderia levar a novos avanços na saúde humana e destacar possíveis maneiras de reduzir ou interromper esse fenômeno nas células cancerígenas.
O Dr. Roger Vila, autor sênior no Instituto de Biologia Evolutiva, mencionou: “A fragmentação dos cromossomos já foi observada em outras espécies de borboletas, mas não em tal magnitude, sugerindo que existem razões importantes para esse processo que podemos agora começar a investigar. Além disso, como os cromossomos contêm todos os segredos de uma espécie, investigar se essas mudanças impactam o comportamento das borboletas pode ajudar a formar um quadro completo de como e por que novas espécies surgem.”
A Dra. Charlotte Wright, primeira autora no Wellcome Sanger Institute, afirmou: “Quando decidimos investigar a evolução em borboletas, sabíamos que precisaríamos sequenciar a borboleta azul Atlas, a mais extrema e um tanto enigmática. Graças ao Roger Vila, que previamente trabalhou com seu colega para encontrar e identificar essa borboleta esquiva, conseguimos sequenciar essa espécie, destacando a natureza colaborativa da ciência. Ao observar, em detalhes, como os cromossomos da borboleta azul Atlas foram fragmentados ao longo do tempo em pontos específicos, podemos começar a investigar quais benefícios isso pode trazer, como impacta sua capacidade de se adaptar ao ambiente, e se há lições em seu DNA que possam ajudar na conservação no futuro.”
O Professor Mark Blaxter, autor sênior do Wellcome Sanger Institute, comentou: “Os genomas contêm as chaves para entender como uma criatura se formou, mas também para onde ela pode ir no futuro. Para contar a história do nosso planeta, devemos conhecer a história de cada espécie e ver como elas interagem umas com as outras. Isso também nos permite aplicar os aprendizados de um genoma a outro. Por exemplo, a reorganização dos cromossomos também é observada em células cancerosas humanas, e compreender esse processo na borboleta azul Atlas poderia ajudar a encontrar formas de limitar ou interromper essa ocorrência nas células cancerígenas no futuro.”
Esta pesquisa recebeu financiamento da Wellcome. Uma lista completa de agradecimentos pode ser encontrada na publicação.
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