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O Espetáculo Governamental, a Trágica Comédia e o Fim da Consciência Cívica

O Chefe de Estado, Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, no seu papel ininterrupto de ‘Rei Sol’ de Belém, frequentemente
O Espetáculo Governamental, a Trágica Comédia e o Fim da Consciência Cívica

O Chefe de Estado, Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, no seu papel ininterrupto de ‘Rei Sol’ de Belém, frequentemente alarma a opinião pública com a gravidade de quem percebe que seu pronunciamento ecoa mais como um sermão de passagem de ano do que um apelo concreto. Sua recente solicitação por “acordos abrangentes” para assegurar a viabilidade do país não é um desejo antecipado para o Natal, mas sim um sinal claro de ineficácia do regime. Trata-se de uma confirmação formal de que o sistema político, em seu núcleo operante em Lisboa, já não funciona conforme as normas fundamentais da responsabilidade. Em vez de avançar, contentamo-nos em debater as rivalidades partidárias e as “questões fraturantes”, perpetuando o aborrecimento institucional. A política atual, à semelhança da administração do século XIX criticada por Eça de Queirós, deixou de ser a arte do viável e transforma-se na arte da distração e da inação sofisticada.

A desgraça reside no colapso do modelo tradicional de alternância entre PS e PSD. O bipartidarismo desmoronou-se, deixando um vácuo institucional que foi rapidamente preenchido por uma gama de forças dissociativas. Estamos imersos em uma instabilidade permanente, evidenciada pelas repetidas dissoluções. Se o bipartidarismo sucumbiu, seu cadáver foi ocupado pela “Comédia Atual”, onde a política se transformou em um “reality show” de espetáculo performático e busca incessante por barulho. A justificativa para esses acordos, fundamentada na fragilidade de uma “democracia muito jovem”, funciona como uma desculpa requintada para a imaturidade persistente da classe política. A fragilidade democrática não é apenas temporal; é ética e administrativa. E, em uma inversão trágica, são os que estão no topo que estão a deteriorar as bases. A crise política nacional impacta diretamente e de forma destrutiva a gestão local. Os autarcas, forçados a enfrentar problemas concretos e não a “gestão panfletária” de Lisboa, tornam-se reféns do caos que se desenrola no Parlamento.

Neste espetáculo, a atribuição de culpa não se restringe a uma única cor. O Partido Socialista se apresenta como o Grande Criador da Instabilidade, utilizando um tacticismo eleitoral cínico para incitar crises, exibindo uma alarmante e contínua falta de sentido de Estado. O seu líder consome mais energia questionando a justeza do opositor do que propondo soluções para o SNS ou a habitação. Essa estratégia também se manifesta na política local, como exemplificado pela suspensão da decisão sobre o novo hospital do Oeste, onde um estudo técnico foi descartado em favor de interesses locais imediatos.

O Chega, por sua vez, prospera precisamente nesta falência. Seu sucesso reside em manter-se fora da responsabilidade governamental e desse discurso localista, cíclico e irresponsável. O interesse deles não é resolver problemas, mas deixar a ferida exposta para capitalizar o descontentamento. Participar de um acordo de regime seria o fim político para quem depende da revolta.

E não podemos esquecer da Esquerda “séria”, que participa ativamente na “comédia” através da polarização ideológica extrema. A política externa foi convertida em um espetáculo eleitoral. Trocando a comida pelo circo, desde que o circo tenha como cenário Gaza e o palco seja a televisão. O uso do caso da frota humanitária (como corretamente se ensina na obra da Professora Doutora Aline Beuvink) é emblemático desse desvio de mandato: A Dr.ª Mariana foi eleita para defender os interesses do Bloco no parlamento, não fora dele.

A coligação AD/PSD, ao tentar estabelecer-se como uma força focada na ação prática, vê seu progresso severamente afetado por uma oposição que constantemente opta pela distorção em vez de um debate sério. A controvérsia em torno do conceito de renda acessível exemplifica perfeitamente isso: uma ferramenta técnica de política pública foi transformada em um slogan simples de atacar, desvirtuando a atenção do mérito da medida para uma caricatura de mesma. Teto máximo significa apenas isso: teto máximo.

O custo final deste espetáculo é tangível e percebe-se diretamente: a paralisia administrativa. O Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) é a metáfora ideal para esse colapso executivo. Sua “máquina pesada” está deixando as Câmaras Municipais “à beira de um colapso nervoso”, correndo o risco de não aproveitar fundos europeus por pura inércia. A crise em Lisboa força o Poder Local a adotar a mesma tática eleitoral, preferindo a inauguração de uma rotunda a um planejamento estratégico de longo prazo. Se existe um ditado que sintetiza a gestão pública em Portugal, é a máxima “Procrastinare lusitanum est”.

A única dignidade que persiste encontra-se no governo local. É no terreno, longe dos arranjos de poder e dos debates improdutivos sobre temas superficiais e moralismos, que se trava a luta pela habitação e pela saúde. Se os partidos em Lisboa são incapazes de discutir salários, SNS ou habitação porque estão ocupados demais a se atacarem mutuamente, que deleguem a tarefa a quem realmente está na linha de frente.

A única coisa que conseguem concordar é a palhaçada. É hora de restabelecer a dignidade da política. Que os senhores se recordem: há vida além de Betesga e o povo busca soluções, não palhaçadas.


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