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A Comunidade e a Atividade no Século XXI

Jorge Teixeira da Cunha, Diocese do Porto O Governo português apresentou recentemente uma proposta para a revisão do Código do
A Comunidade e a Atividade no Século XXI

Jorge Teixeira da Cunha, Diocese do Porto

O Governo português apresentou recentemente uma proposta para a revisão do Código do Trabalho, agora em discussão pública. A justificativa apresentada é a modernização da legislação laboral, adaptando-a a novas realidades, combatendo a precariedade, regulando o trabalho temporário e a contratação de colaboradores externos, além de fortalecer os direitos dos trabalhadores, em especial dos trabalhadores independentes, e incrementar a produtividade, entre outros. A proposta também busca regular aspectos como a harmonia entre trabalho e maternidade. Qual reflexão se pode fazer sobre isso à luz da doutrina social da Igreja?

A Igreja não tem a responsabilidade de elaborar leis, mas está atenta ao espírito que as movimenta e aos valores que elas promovem. É evidente que, ao legislar, é preciso considerar novas condições. Entre estas, destaca-se a possibilidade proporcionada pela tecnologia de trabalhar remotamente, as preferências das novas gerações, que desejam gerenciar suas ocupações sem um vínculo fixo a uma empresa, e a necessidade de equilibrar a maternidade e o trabalho. Contudo, a questão do trabalho é atemporal e deve ser avaliada conforme um conjunto de valores que não devem ser negligenciados. Entre estes, destacamos alguns pontos importantes.

Qualquer reforma trabalhista deve centrar-se no trabalhador como sujeito do seu labor. O ser humano enquanto trabalhador deve ocupar a posição central na questão laboral. É crucial afirmar isso com segurança, especialmente em um contexto onde a cultura e a economia contemporâneas tendem a tratar o trabalho como uma realidade mensurável e objetiva. Na proposta de revisão das leis trabalhistas, essa centralidade do trabalhador não está adequadamente refletida. Não observamos preocupação com a formação contínua dos trabalhadores nem com iniciativas que visem a melhoria das condições laborais.

Além disso, o trabalho humano também é uma experiência coletiva. O ser humano trabalha em colaboração com outros. Portanto, a empresa não pode ser enxergada apenas como um conjunto de funções, mas sim como uma comunidade de pessoas. Observa-se que a dependência dos trabalhadores, tanto no âmbito empresarial quanto no contexto global, persiste. Embora já não estejamos na era inicial da revolução industrial, ainda existe uma estrutura de poder global que se sobrepõe aos trabalhadores. Qualquer revisão das leis laborais deve estar atenta a esse aspecto e garantir a participação dos trabalhadores nas decisões que afetam a continuidade da atividade e a melhoria dos processos.

No entanto, há um ponto que está completamente ausente: a questão salarial. Este tema é deixado inteiramente nas mãos das forças do mercado. E isso não é aceitável, de acordo com a doutrina social da Igreja. O trabalho suscita a questão da justiça. Embora seja complicado definir o valor monetário do trabalho, há um fato inegável: o ser humano vive do trabalho. Uma reforma trabalhista verdadeira deve colocar em seu centro a preocupação com a distribuição justa dos frutos do trabalho. Aparentemente, a porcentagem do lucro das empresas destinada aos salários tem diminuído em comparação com outros elementos, como a remuneração dos executivos e o retorno ao capital. Isso é incoerente sob a ótica de uma ética social cristã. Observa-se, inclusive, um sistema internacional que apropria o valor do trabalho, distanciando ainda mais os trabalhadores. A doutrina social da Igreja visualiza com ceticismo a predominância dos chamados “dadores indiretos do trabalho”. Uma reforma que considere a situação atual deve buscar aumentar a remuneração direta do trabalho, em vez da administração indireta do rendimento pelas complexas estruturas do chamado Estado social. Os trabalhadores estão cada vez mais capacitados para gerenciar sua própria renda, que deve ser creditada diretamente a eles, em vez de vir na forma de assistência social distribuída de maneiras pouco transparentes, como no caso das prestações em saúde, educação e outras ajudas cuja legitimidade não integra o pacto moral que une os integrantes de uma sociedade.

Por fim, a doutrina social da Igreja não se oporia a um entendimento onde os custos da maternidade e da procriação fossem compartilhados pela sociedade. Dentro de uma perspectiva aceitável da família, seria pertinente discutir um salário social para mães em idade fértil, que lhes permita cuidar adequadamente de si mesmas e de suas crianças. Isso representaria um extraordinário avanço para o futuro.

(Os artigos de opinião publicados na seção ‘Opinião’ e ‘Rubricas’ do portal da Agência Ecclesia são de responsabilidade de seus autores e refletem apenas suas opiniões.)

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